sábado, 20 de outubro de 2012

MINHA ESSÊNCIA


Ando meio seco de ideias. Por isso deixo aqui uma das minhas crias do passado.

MINHA ESSÊNCIA


Olhe para mim e receba do meu sorriso,
Parte da minha essência -
Num riso breve e impreciso...
Tente decifrar o que ele quis dizer-te
Apenas com a tua imaginação.
Entenderás, porém, que esta tarefa é complicada,
Pois a maior parte da essência do meu ser
É em minha alma que está guardada.
Só terás acesso a ela,
Doando parte da tua essência,
Na forma de um sorriso...
Ou até na forma de um aperto de mão...
Abraça-me amigo
Diga-me bom dia, trata-me por irmão!

Isaías Gresmés 18/04/2009

sábado, 15 de setembro de 2012

MINHA HISTÓRIA


MINHA HISTÓRIA*

Minha mãe antes de me deixar, ensinou-me muitas coisas. Ainda sinto a presença dela e sei que ela nunca me deixará sozinho.
Certo dia perguntei à minha mãe como foi que eu cheguei a este mundo. Foi assim que ela me narrou o ocorrido:
- Meu filho era já tarde da noite, seu pai dormia ao lado da sua inseparável carroça, quando os doloridos sinais da natureza, avisaram-me que era chegada a hora de eu ser mãe. Aninhei-me ali perto do seu pai e confiei a minha sorte à suprema força que tudo rege, seja ela quem for.
- E meu pai mãe? Ele não te ajudou? – a interrompi, ansioso por saber da atitude que ele tomara na ocasião.
- Ele roncava meu filho... Por certo estava sob o efeito daquela coisa que o transformava quando ele a consumia...
- Entendo. Mas, continua!
- Você não veio sozinho não! Antes de você nasceu seu irmão, mas infelizmente a vida não quis nele aflorar, pois ele veio a este mundo apenas para cumprir aquela que para a maioria é a última etapa...
Minha mãe neste momento olhava para o horizonte como a refletir e continuou na narrativa.
- Logo em seguida veio você que, ao contrário do seu irmão, gozava de saúde!
- Que legal mãe!


Foi assim que eu fiquei sabendo da minha origem.
Minha mãe, a cada dia que se passava, eu sentia que ela já não trazia em seus olhos, o vigor de antigamente... Meu pai também se deteriora muito nos últimos tempos. E a causa era aquela água estranha que ele bebia.
Eu ficava muito triste com ele, mas o amava tanto quanto amava a minha velha mãe.
 Ela sempre me dizia:
- Meu filho, nunca abandone seu pai! Lembre-se, ele nunca deixou faltar nada para a gente... É certo que ele anda adoentado devido àquela coisa que ele toma a toda hora, mas é um homem bom e também nos ama. Esteja com ele mesmo depois que eu partir.
- Para onde a senhora vai partir mãe?
- Não sei meu filho, mas sinto que a minha hora está chegando! Mas não tenho medo não!
Neste momento minha mãe me ensinou uma lição que segue gravada em meu ser até hoje. Foi assim que ela iniciou a tal lição:
“ Eu sinto que já cumpri com a minha missão neste mundo... Nasci, cresci, tive a felicidade de arrumar um pai para você e agora me sinto pronta para seguir adiante... Já vi muitos dos meus semelhantes abandonados, surrados, mortos nas esquinas e até jogados em qualquer lugar, mas nada disso me assusta, pois sei que o que estava lá abandonado, surrado ou até morto em qualquer lugar, era apenas a parte que vira pó; algo parecido com os alimentos que comemos: parte alimenta nossos corpos; outra parte é  descartada por nossos organismos e virará pó novamente. Meu corpo virará pó, mas alguma coisa que vive dentro de mim não! Essa coisa que eu não sei nomear, permanecerá te vigiando para todo o sempre meu filho”.

Após algum tempo minha mãe se foi.
Meu pai ficou muito triste, mas dentro das suas possibilidades, concedeu a ela todas as honrarias fúnebres que certamente minha velha merecia.
Naquela noite meu pai, penso eu, exagerou no consumo daquela água fedida. De madrugada, também seu coração parou de bater. Cheguei bem perto dele e lambi-lhe a face já sem vida.
Agora eu estava sozinho no mundo, mas não sentia medo, pois sabia que minha mãe me vigiava e, talvez, meu pai também.

De repente senti alguns ruídos perto dali. Eram ruídos de rivais. Também senti um cheiro que me deixou alucinado. Aquele era um chamado do qual eu não pude resistir: era um cheiro de fêmea!
Sim, eu estava pronto para o combate com meus rivais! Era chegada a hora de perpetuar a minha espécie! Lambi a face novamente do meu velho e parti para cumprir mais uma etapa do meu destino, agora confiando apenas no meu instinto.

* Cachorro, às vezes, parece gente; e gente, às vezes, parece cachorro...


ISAÍAS GRESMÉS, 15/09/2012    

Meus sinceros agradecimentos aos amigos: Gerônimo e Luana.

       Meus queridos amigos, agradeço-lhes de toda a minha alma, pela gentileza de prestigiar a minha humilde página. Esse tipo de ação não não tem como mensurar, tampouco quantificar. Que Deus reserve a vocês as melhores recompensas.
        Da minha parte, continuarei na minha trajetória, escrevendo o que me vem na mente, na esperança de sempre encontrar almas caridosas, como as vossas, dispostas a reservarem alguns instantes das vidas, para a leitura dos meus textos.
       Abraços do amigo Isaías Gresmés.

15/09/2012

terça-feira, 1 de maio de 2012

O DESPERTAR DO COMA



“Mais um dia, e tudo parece se repetir para mim. Ainda ontem acordei com a mesma sensação. Já faz algum tempo que eu não vejo minha mãe, meu pai, meus irmãos... Onde será que eles se meteram? Cá estou eu de novo, esperando meus amigos. A gente combinou de se encontrar para ir à passeata que ocorrerá no centro, em prol das Diretas Já. Eu particularmente acredito que, de agora em diante, as coisas vão começar a andar nesse país...
...Lá vêm eles
...Engraçado, tudo parece se repetir... Até posso predizer o que acontecerá no próximo minuto: os caras vão chegar naquele entusiasmo, afinal quem está à frente da nossa turma é o Claudião; esse cara é uma figura... quando bota alguma coisa na cabeça, ninguém tira. Lá na escola ele convocou toda a galera para a tal passeata.
 ‘Meu, agora é com a gente! Não podemos dar mole, senão perderemos essa chance que é única, de mudar definitivamente os rumos desse país! Abaixo a ditadura! Viva o Brasil!’ 
- O Claudião é gente fina...

Agora já estamos indo para o centro de São Paulo a fim de participar do movimento pelas Diretas. O ônibus está lotado, o dia está chuvoso, mas nada apaga nossa vontade de participar de um movimento que poderá mudar os rumos do nosso país... E eu já sei o que vai acontecer logo adiante, naquela curva... O ônibus vai derrapar, e, após isso, já não sei mais nada... Vou acordar no outro dia; notarei pelas ausências dos meus familiares; minha turma vai aparecer e novamente iremos à passeata em prol das eleições diretas; nosso ônibus vai derrapar na curva e, a partir dali eu não sei mais o que acontecerá...
 Será que eu morri?
A morte seria uma espécie de prisão num determinado intervalo de tempo ocorrido durante a vida?
 E se for isso, quem teria o poder de fazer o tempo andar?
 Ou estaria eu apenas sonhando um sonho enfadonhamente cíclico? Definitivamente não sei o que está acontecendo comigo... O engraçado é que eu tenho consciência de que algo muito estranho está acontecendo, mas não tenho como interferir...

Mais uma vez avisto a turma vindo na direção da minha casa... À frente se destaca o Claudião... Ele profere o mesmo discurso de ontem... anteontem... Eu já decorei a fala dele e de todos os outros meus amigos...
O ônibus...
 A curva...
 A  derrapada e, o que está acontecendo?
Que luz forte é essa?
 Meus olhos... Essa luz é muito forte... Meus olhos, não consigo enxergar direito...”

- Meu filho! Graças a Deus! Você está de volta! Obrigado meu Deus!
- Mãe... Que luz é esta... Apaga esta luz, por favor!
- Oh meu filho, é claro, apago sim... Você ficou muito tempo com os olhos fechados, vai ter que se readaptar... Mas o mais importante é que você está de volta! Obrigado meu Deus!

E assim, após passados vinte e oito anos, Januário, filho de dona Ambrosina, sai do coma. Ele havia sofrido um terrível acidente no dia em que estava indo para uma grande manifestação popular a favor das eleições diretas no país. Numa curva na Avenida 23 de Maio, o ônibus em que se encontrava capotou duas vezes e, em seguida pegou fogo. Todos os ocupantes morreram, exceto ele, o Januário. Mas a partir daquele dia ele mergulhou num estado de coma e, somente agora, depois de quase três décadas, ele volta à vida normal.
Sua recuperação após sair do coma foi surpreendente. Em poucos dias já falava, se alimentava normalmente e, passados alguns meses, já estava andando. Mas uma coisa não mudou: ele havia envelhecido vinte e oito anos sem se dar conta. Sua mente estava presa ao passado. Para ele era difícil até se acostumar com o próprio rosto, castigado pela passagem do tempo e pelas marcas do acidente do passado. Januário precisava tomar um rumo na vida. E tomou. Numa noite, após o jantar, dirigiu-se ao irmão mais velho e fez uma solicitação para ele:
- Joaquim, me ensina a mexer neste tal de Google?

E foi assim que Januário começou a sair da terrível prisão do intervalo de tempo que o estado de coma lhe impusera.

ISAÍAS GRESMÉS, 1/05/2012

  


domingo, 15 de abril de 2012

NUM OLHA, PORQUE É SACI!




Foi durante uma caçada que um fato inusitado chamou a atenção dos dois compadres. Estavam passando numa capoeira, quando um redemoinho surgiu do nada levantando poeira e as folhas secas em volta. Compadre Gildo, na ânsia de comprovar um causo que a sua mãe lhe dizia sempre na infância, virou para o compadre Justino e disse:
- Cumpadi Justo, minha mãe me ensinou que quando um rodemoin aparece ansim do nada, que isso é coisa do saci! E se a gente oiá por debaixo das perna, a gente vê o lazarento – eu vou oiá!
- Nossinhora cumpadi Girdo! Num faiz uma miséria dessa não home di Deus! Prestenção num causo que aconteceu comigo há muito tempo.
Compadre Justino, ainda meio assombrado com a visão do redemoinho, respira bem fundo e começa a falar o ocorrido:
- Foi ansim cumpadi Girdo: certo dia eu tava seguino um Carrero de tatu numa capoeira iguar a essa... me acompanhava somente o meu cão Três Zói... De repente, do nada, surge um redemoinho... Três Zói some e me deixa sozinho.
- E o cumpadi num ficô cum medo não?
- Que nada cumpadi Girdo! Da mesma forma que o sinhô, eu também havia escutado a minha mãe falá que se o caboclo oiasse por debaixo das pernas, ia dá de cara com o saci. Eu tava era querendo matá a minha curiosidade sô!
- E o sinhô oiou?
- Uai, mas é claro cumpadi!
- E o que aconteceu adispois sô?
- Prestenção (com os olhos esbugalhados mirando para o infinito, compadre Justino continua a narrativa): ansim que o redemoinho se aprochegou de mim, eu me virei de costas pra ele e, em seguida, oiei o troço por debaixo das perna.
- E ai cumpadi, fala logo o que aconteceu?!
- Carma cumpadi, que eu já chego lá sô! – Num deu nem tempo deu vê nada, pruque recebi um baita dum pontapé no traseiro!
- E quem te chutou cumpadi Justo?
- E num foi o lazarento do saci?
- E foi é?
- Pois é cumpadi. Ansim que eu recebi aquele pontapé me virei rápido pra vê quem tinha feito aquela desfeita comigo e foi ai que eu me deparei com o danadim!
- E ai cumpadi, fala logo!
- Ai eu pensei cá com os meus juízo: “vou descontar essa desfeita, isso num vai ficá ansim, ah, num vai não!”
- E o que o sinhô feiz?
- Comecei a prosear cum o mardito!
Compadre Gildo já não agüentava de tanta ansiedade. Querendo saber como aquele causo iria terminar ele perguntou ao Justino:
- E qual foi o rumo da prosa?
- Eu, pra mor di ganhar tempo, arresorvi preguntá pra ele o porquê dele ter me chutado a bunda. Ele me arrespondeu que era para mor di eu deixá di ser inxirido!
- Vai veno... Mas cumpadi, questionou compadre Gildo, pruquê o sinhô queria ganhar tempo com o neguim perneta?
- Ara cumpadi, era pra mor di dá uma lição nele uai!
- E qual era o plano do sinhô?
- Era o seguinte: minha mãe havia me ensinado que o saci, antes de sair para fazer travessuras, abastece o seu cachimbo o suficiente para realizar suas malinações, pruque adispois que o fumo acaba, também acaba o seu poder, entendeu?
- Hummm! – Sei... mas e daí, o que o sinhô feiz?
- Eu fiquei esticando o papo ali. Pedi discurpa pra ele pelo meu inxirimento; falei que a caça tava dificir... até que eu apercebi que o fumo do danado tinha acabado.
 - E ai, o que aconteceu?
- Vai veno cumpadi – ele que num é bobo nem nada, já tava se preparano pra ir pro além; ai eu coloquei meu plano pra funcioná.
- E o que o cumpadi tramou contra o mardito?
- Ele falou que ia imbora pruquê havia acabado o seu fumo. Ai eu ofereci o meu fumo que eu trazia na argibera já cortadim, pronto pra pitá.
- E ele aceitô sua oferta?
- Mas não! Craro! O mardito adora tirá vantage em tudo, parece inté político!
- Continua, continua cumpadi Justo!
- Ai eu nem deixei o mardito pensá muito. Peguei o cachimbo dele e, nesse momento, passava uma comitiva lá na baixada. Eu dei um grito bem forte: “Diga ai coroné Gresmelino!” – e lá de longe, o coroné acenô com o braço pra mim.
- E o coroné viu o saci que tava do seu lado cumpadi?
- Craro que não! O danado só se mostra pra quem ele qué uai! – Mas continuano: - ai eu aproveitei que o danado se distraiu com a comitiva, intonce eu peguei rapidamente um pouquim de porva e atuchei no fundo do cachimbo do lazarento! E enchi o restante com meu fumo.
- Sério cumpadi?!
- Sério uai!
- E adispois, o que aconteceu?
- Ai o mardito encostou o dedo no fumo e acendeu o pito. Deu uma baforadas e me agradeceu pelo fumo. Inté me elogiou pela qualidade do tabaco, credita?
- Credito, cumpadi, mas e ai?
- Ai que adispois de um minuto, foi cachimbo e saci para os ares!
- Ele sumiu cumpadi Justo?
- Sumiu cumpadi Girdo, escafedeu-se! – E eu continuei minha caçada. Naquele dia eu ainda consegui caçá um peba de uns sete quilos!
- Mas é cumpadi?!
- E num foi!
- É por isso que eu falo cumpadi, num olha pra redemoinho não viu... Ih,olha lá, vem um ali ó!
 - Vamo cumadi Justo!
- Vamo cumpadi Girdo!

Pois é, essa é apenas uma das muitas lendas que ouvi na infância. Eu nunca tive coragem de tirar a prova dos nove. E você, caro leitor(a), já teve?

ISAÍAS GRESMÉS, 15/04/2012



sexta-feira, 13 de abril de 2012

ELE EMITIA LUZES E NÃO ERA VAGALUME




O sol já estava se pondo quando me despertei. Numa rápida olhada procurei por minha mãe e as minhas irmãs, mas elas não estavam ali. Através de uma das frestas na tábua da parede pude ver minha avó, mãe do meu pai, no tanque, lavando roupas. Mas algumas luzes estranhas desviam minha atenção para o fundo do pequeno quarto. Tomei um susto, mas não gritei. Fiquei a fitar “aquilo”. Confesso que jamais havia visto algo daquele jeito na minha curta existência (eu tinha apenas seis anos!).
A criatura, seja lá o que fosse, emitia luzes pelo corpo todo, nas cores: verde, amarela, vermelha e azul. Hoje eu diria que se assemelhava a um robô.
Eu fiquei em pé na cama, e o “não sei quê”, veio na minha direção sem fazer um só ruído. As luzes pulsavam como a imitar um coração – um silencioso coração. À medida que ele se aproximava de mim, eu me afastava dele andando de costas na direção oposta. Eu estava muito amedrontado, mas sentia no meu íntimo ainda verde de criança, uma certeza de que aquela criaturinha não estava ali para me fazer mal. Apesar dessa confiança que crescia dentro de mim, senti-me mais aliviado quando o “abajur ambulante” retornou para o seu ponto de partida no fundo do quarto. Mais rápido que minhas próprias pernas, avancei na direção da porta, abri a tramela e fui de encontro com a minha avó.
“Sua mãe te deixou sozinho?” Respondi que sim. Ela pegou na minha mão e me levou com ela. Eu olhei para o pequeno barraco onde morava com a minha família e pude comprovar que aquele ser ainda estava lá, pois suas luzes se propagavam pelas frestas do casebre.
Mais ou menos uma hora depois chegam minha mãe e minhas irmãs. Elas estavam no poço comunitário lavando nossas roupas. Fui ao encontro da minha mãe que trazia uma lata d’água na cabeça, majestosamente equilibrada numa rudia de pano; e em cada uma das mãos, um balde cheio de roupas lavadas. Fiquei super feliz porque a mulher mais forte do mundo estava ali para me proteger daquele sujeitinho esquisito. Após rápida conversa minha mãe se despediu da minha avó e finalmente nos dirigimos à nossa humilde casa.
Minha heroína abril a tranca improvisada que mantinha a porta fechada por fora e, para minha surpresa, a criatura não mais estava lá!

Hoje, passados mais de trinta e três anos, ainda tento entender o que era, o que estaria fazendo ali e por que me visitou aquele ser provido de luz própria.
 No decorrer de todos esses anos ouvi inúmeras explicações para o fato, algumas interessantes; mas a maioria somente chacotas. Esse episódio marcou a minha vida e, de certa maneira, influenciou-me até nos meus escritos. Procuro sempre ser racional sem me prender em misticismos ou coisas semelhantes. Sendo assim, racionalmente, espero a visita do serzinho iluminado novamente, e agora com uma mentalidade de adulto. Pretendo travar diálogos intermináveis com ele, sem ser abusivo, é claro! Vou tratá-lo da melhor forma possível, pois acho que ele vem de longe. E quem se presta a tão longa viagem, por certo, merece todo meu apreço. Quem sabe, não é mesmo? 


ISAÍAS GRESMÉS, 13/04/2012

sábado, 7 de abril de 2012

JESUS, A LUZ DO MUNDO.



Foi no ventre de Maria
Que o Pai veio deixar,
Aquele que, então seria,
O amor a nos guiar.

Nasceu numa manjedoura,
Cercado por animais,
Sob as mãos protetoras
De José, o seu bom pai.

Guiados por uma "estrela"
De brilho encantador,
Os reis magos, ao vê-la,
Acharam nosso senhor.

Foram lá testemunhar
O nascimento do Divino:
Belchior, Baltazar e Gaspar.
Presentearam o menino.

Escapou, mas por um triz
De Herodes, o mandatário;
Sujeito vil, infeliz,
Um completo sanguinário!

Ao saber das profecias
Que anunciavam no momento,
Sobre a vinda do Messias,
Gritou para os quatro ventos:

“Matem todos os meninos,
Sem dó e sem clemência!”
E logo seus assassinos
Cumpriram a má sentença...

José fugiu com Maria
Para a cidade de Belém:
Aonde, então, nasceria
O sinônimo do Bem!

Cresceu fazendo a bondade,
Semeando ensinamento.
E falava, com propriedade,
Sobre o Deus do firmamento...

Curou olhos da cegueira;
Fez o aleijado andar;
Levou a paz verdadeira
Apenas com o olhar!

Multiplicou o peixe e o pão
Para quem sentia fome,
Somente com a oração
A Deus, o santo nome!

Devolveu o morto à vida,
Com o intuito de ensinar
Que até esta ferida
O amor pode curar!

Ensinou que o amor
É o caminho a trilhar,
Pois, com Ele não há dor
Que possa se propagar.

Mostrou que a bondade
Precisa ser praticada.
Porque ela é caridade,
Uma coisa abençoada.

Praticou a caridade
Cada dia do seu dia.
E enfatizou, em verdade,
Que viver assim valia.

Ensinou que a salvação,
Na caridade, estaria.
E alertou que esta lição,
Por certo, nos salvaria.

Mas o mal se fez presente
Na vida do Salvador:
E com traição demente
Prenderam nosso Senhor!

Trinta nicas de dinheiro
Foi o que Judas recebeu,
Para trair o Verdadeiro,
O bondoso Galileu!

À morte foi condenado,
Mas bem antes já sabia,
Que seria denunciado
Por aquele que O beijaria...

Judas foi o infeliz
Que entregou nosso Senhor.
Pois sua fé, sem raiz,
Não viu Nele o amor!

Foi numa sexta-feira
Que ele foi crucificado,
Lá no monte da caveira,
Por um grupo de soldados...

Barganharam a sua vida
À soltura de um ladrão.
Uma troca mal escolhida
Que ficou como lição!

Dos dois lados de Jesus
Foram postos dois ladrões;
Cada um na sua cruz
Sofriam suas punições.

Um deles se arrependeu
E disse, com alta voz:
“Tu és o filho de Deus
For favor, olhai por nós!”

“Meu amigo, acreditai
No que vos digo de coração:
Hoje vos vereis meu Pai
E a mim seu vosso irmão!”

Sentindo a vida esvair,
Jesus, enfim reclamou:
Alguns puderam ouvir
(Por que Deus o abandonou?).

Mas antes de morrer,
Fez do verbo perdoar,
Na sua escala percorrer
Seu mais alto patamar!

Seu corpo foi sepultado
Com singelo funeral.
Mas com três dias passados,
Vence a morte triunfal!

Jesus sempre viverá
Em quem o tem por devoção.
E para sempre reinará
Na vida do bom cristão.

Jesus Cristo é a estrada
Que conduz à salvação.
Percorremo-La, de mãos dadas
Pois todos somos irmãos!

ISAÍAS GRESMÉS, 07/04/2012






































sábado, 31 de março de 2012

O ZEQUINHA E O JOSÉ CARLOS






Todo mundo conhecia o José Carlos Almeida, popularmente chamado de Zequinha. Ele era figura mais que presente no bairro. No seu rosto o sorriso estava sempre presente e suas mãos quase sempre estavam ocupadas com componentes eletrônicos velhos que ele achava nos terrenos baldios da vizinhança. “Se a gente não reparar nem dá para perceber que o Zequinha tem algum problema”, era o que todos falavam.
Zequinha nasceu com retardo mental. E mesmo com vinte e cinco anos, comportava-se como se tivesse uns sete. Seu passatempo preferido era juntar restos de eletrônicos velhos. Dizia que iria construir uma nave para viajar até o céu. “Eu quero conhecer o papai do céu”, costuma explicar bem sério a quem o perguntasse sobre o que estava fazendo com tudo aquilo.
A mãe de Zequinha, dona Maria, era uma batalhadora. Casou-se cedo com aquele que foi o seu único homem. “Foi amor à primeira vista, coisa de contos de fadas, mas eu não podia esperar que o meu príncipe se transformasse na bruxa do meu conto de fadas particular”, lamentava-se tristemente quando perguntada sobre seu companheiro.
 Seu casamento ruiu logo no começo, depois que seu marido caiu na desgraça de usar o crack. A pobre mulher, mesmo grávida de alguns meses, era espancada pelo infeliz companheiro todos os dias. O amor que sentia por ele foi se transformando em ódio. Mas não era por ele que ela sentia repulsa, era por aquela droga maldita.
Um dia o homem chegou completamente louco, gritando que queria dinheiro. Ela disse a ele que não havia mais nada na casa, pois ele mesmo havia vendido tudo. O pobre infeliz, na agonia da falta da droga, correu na direção da janela e voou para a morte.

Alguns meses depois veio ao mundo aquele que ficou conhecido mais tarde como Zequinha. Dona Maria enfrentou muitas dificuldades para criá-lo, pois seu filho nascera com sérias limitações intelectuais, mas nunca mais se envolveu com nenhum homem. “Minha vida agora é para criar o meu filho, pois ele é a razão do meu viver”, emocionava-se sempre quando indagada sobre o porquê de não ter se casado novamente.

Zequinha realmente era uma criatura amável, apesar das suas limitações, ajudava a mãe nos afazeres domésticos, frequentava a escola especial que a mãe tanto se esforçara para conseguir uma vaga e adorava ir às missas dominicais para cantar os louvores. Mas sua paixão era o seu “projeto”: passava o tempo todo revirando os lixos à procura de componentes eletrônicos para “construir” sua “nave espacial”. No começo dona Maria ralhou com ele, mas depois parou, pois entendeu que aquilo era um passatempo dele e era uma atividade que o fazia muito feliz.

Certo dia dona Maria foi até o fundo do quintal onde brincava Zequinha. Ela logo o avistou. “Obrigado meu Deus, por ter me enviado um anjo... Não sei o que seria de mim sem ele... Obrigado pai amado!”, agradeceu em pensamento a religiosa senhora. Em seguida, sem que ele notasse, voltou à sala da casa, pegou a sacola cheia com roupas que havia consertado e foi entregá-las às clientes ali perto.
Zequinha, completamente envolvido com a sua atividade, não percebeu nem a mãe, tampouco aquelas criaturas que apareceram do nada e o cercou. Eram três. Nenhum ruído, nenhuma marca. Zequinha se foi com eles. Dona Maria, no exato momento do acorrido com Zequinha, desmaiou por alguns segundos. Tempo suficiente para sonhar com um futuro melhor para o seu filho.

PARTE II

“O que aconteceu dona Maria! – a senhora está bem”. “Sim, estou, não foi nada. Agora preciso ir”.

Os vizinhos se mobilizaram, produziram cartazes que informavam sobre o desaparecimento do Zequinha. O líder comunitário levou dona Maria até o Distrito Policial da região. Mas dona Maria estava tranquila, e sempre afirmava que seu filho fora levado por anjos de Deus e que Zequinha iria voltar completamente curado da sua enfermidade de nascença. Quando falava, exibia um semblante de fé e alegria. Todos concluíram que Dona Maria estava enlouquecendo.

Cinco anos se passaram. Dona Maria continuou levando a vida como se nada estivesse acontecido. Quando lhe perguntavam sobre Zequinha, ela apenas dizia: “Deus vai me mandar ele de volta e curado do seu problema mental”. “Pobre criatura! Está louca!”, concluíam todos.

Certa tarde, como sempre fazia antes de sair para entregar as encomendas de roupas, dona Maria foi até o fundo da casa. Foi quando do nada aparece Zequinha. Ele estava mudado. Seu rosto estava com a barba feita, seu cabelo impecavelmente penteado e o corpo bem vestido com belo traje. Ele abriu os braços e sorriu. “Vem cá mãe, obrigado por ter me esperado”. “Oh Zequinha, você nem imagina como eu estou feliz”. “Minha mãe, o Zequinha foi aquele que foi curado por Deus, de agora em diante a senhora e todos me chamarão pelo meu nome de registro, ou seja, José Carlos”. “Que assim seja meu filho.”

Todos os dias pessoas com problemas mentais desaparecem do nada e nunca mais voltam. Mas elas nunca desaparecerão dos corações daqueles que as amam.

ISAÍAS GRESMÉS, 31/03/2012
 





ABDUZIDO




   Durante o interrogatório em uma pequena sala, João tenta explicar o que ninguém ali conseguia entender: como ele reaparece do nada, após vinte anos e, sem praticamente nenhum sinal de envelhecimento? Ele, na sua intimidade, também estava se esforçando para entender aquela situação assustadora . O que afinal havia acontecido consigo próprio? Por que a sua mãe, o seu pai, seus irmãos e os amigos estavam todos com uma aparência de mais velhos e ele não? Isso sem contar que, ao olhar para o local onde vivera toda a  vida, notara que estava completamente mudado em relação à imagem que tinha gravada na mente.
    João, confuso, relata o que se passara com ele algum tempo atrás. Seu caso despertou a atenção de autoridades científicas do mundo inteiro. Na pequena sala, aquele cientista estava ansioso por ouvi-lo:
   - Foi assim: naquele dia acordei às 6h, como me era de costume... Fiz um café, tomei uma pequena xícara e logo em seguida saí para minha corrida matinal. Naquele dia, não sei porquê, resolvi fazer um caminho no qual eu ainda não havia percorrido. Era uma trilha no meio de uma pequena mata perto da minha casa... Eu sempre gostei de entrar em contato com a natureza e, embora aquele caminho fosse desconhecido para mim, resolvi percorrê-lo... Quando eram passados mais de 15 minutos,  e eu sei que era esse o tempo porque olhei no meu cronômetro, avistei um obstáculo no meu caminho: tratava-se de uma enorme árvore caída... Acho que foi devido à tempestade da noite anterior. Fui obrigado a me embrenhar no mato para me desviar dela. Foi neste momento que eu caí num poço bem fundo e...
    - Espera aí meu jovem - levanta a voz, Afrânio, o cientista, um físico conhecido do país – Como isso é possível, se você não apresenta nenhuma cicatriz, sem contar que já se passaram vinte anos?!
   - Eu não sei dizer, mas foi isso que aconteceu... Quando cheguei lá embaixo comecei a sentir dores horríveis como eu nunca havia sentido... Minhas pernas estavam quebradas e...
    - Sei, disse Afrânio, interrompendo-o mais uma vez, com ar de desdenho.
    - Continuando: minhas pernas estavam quebradas e os ossos estavam expostos...  Mas eu não as sentia... Havia perdido a sensibilidade da barriga para baixo... Meus braços também estavam quebrados... Um deles, o esquerdo, estava pendurado por um pedaço de músculo... Eram deles que eu sentia uma dor que não quero nunca mais sentir.
   - Seu João, francamente, o senhor acha que alguém vai acreditar nesta sua explicação?
   - Olha aqui meu senhor, grita João já visivelmente irritado, se não quiser escutar o que eu tenho a dizer, é só ir embora!  - Eu estou relatando o que aconteceu comigo, sem tirar nem por, agora acreditar ou não, depende você! – Por isso peço-lhe por gentileza, que não me interrompa mais, pode ser?
   O cientista, constrangido, acena positivamente com a cabeça.
   E João prosseguiu relatando o acontecido até chegar num ponto perturbador.
   ... – Fiquei naquela agonia por mais ou menos umas duas horas... Já estava com dificuldades até para respirar... Minha visão foi ficando cada vez mais turva... Minha boca seca... Notei que algumas sanguessugas estavam se concentrando na região das fraturas expostas das minhas pernas... Eu tentei retirá-las, mas a cada esforço da minha parte, sentia que poderia morrer... Foi neste momento que algo muito estranho aconteceu – João respirou fundo, olhou para o físico e continuou sua narrativa:
    - ... Uma luz intensa, tão forte quanto a luz do sol, preenche todo o fundo do poço... Eu fiquei feliz e pensei “estou salvo”... De repente uma força estranha começa a manipular meu corpo e, depois disso, apaguei.
   O silêncio na sala era sepulcral.
   - Posso fazer-lhe algumas perguntas agora?
   - Sim.
   - E depois, aonde você foi?
   - Não sei seu Afrânio, primeiramente me vi cercado de pessoas cujos rostos eu não podia ver. Eles estavam mexendo no meu corpo. Era uma equipe enorme. Deduzi que eram médicos. Só que fiquei muito confuso, pois eles usavam equipamentos estranhos que emitiam luzes e nada falavam, porém eu percebi que havia um completo entendimento entre todos e a comunicação se dava apenas com o olhar.
   - Como assim?
   - É só isso que eu tenho a dizer. Não sei quem eram aquelas pessoas, só sei que eles consertaram meu corpo e me devolveram à vida.
   - Você mencionou que foi “manipulado por luzes”. Poderia explicar isso?
   - Foi exatamente assim: primeiramente eu me vi ofuscado por aquela luz intensa e, a seguir, senti aquela luz manipular meu corpo, como a me atrair para ela. Foi neste momento que eu desmaiei.
   - E após a “cirurgia”, o que aconteceu depois?
   - Algum tempo depois eu já estava convivendo com várias pessoas, só não conseguia distinguir seus rostos, porém dentro de mim era como se eu tivesse vivido ao lado delas sempre. Passeávamos por imensos parques, cultivávamos extensas áreas com variados cereais, estudávamos, praticávamos esportes e ensinávamos também; enfim, a minha vida prosseguiu de uma forma bem dinâmica como nunca antes havia sido.
   - E você não achou estranho tudo isso?
   - Para ser sincero não senhor! – É estranho, mas eu nem me lembrava dos meus pais... Era como se aquelas pessoas as quais eu não conseguia reconhecer o rosto fossem também parte de mim, como a minha mãe, meu pai e meus amigos, entende?
   - Está difícil para mim acreditar nisso... E como o senhor explica essa sua ausência durante vinte anos em que o senhor praticamente não sofreu com a passagem do tempo?
   - Eu não sei... Só me lembro do dia em que me despedi de todos os meus amigos sem rostos. Eles nada disseram, como, aliás, era de costume, mas eu entendi que já era hora de eu partir. Naquele dia um deles me fez uma revelação...
   - E qual revelação é essa?
   - Ele me disse, e disse-me do jeito peculiar deles, que eu mostraria aos humanos, quando chegasse a hora, que a Terra era apenas um dos lares da humanidade, que outros haviam e o caminho estava em mim. Em seguida entrei num portal de luz e acordei na minha cama, a qual minha mãe deixara arrumada no decorrer desses longos vinte anos.
   - Fale-me sobre esse “portal de luz”.
   - Tinha um formato oval; sua luz não era tão intensa. Quando eu dei um passo para dentro dele, já acordei lá na minha cama.
   O cientista sorriu satisfatoriamente e concluiu:
   - João, você é a prova viva de que existem buracos de minhoca e que é possível as viagens interplanetárias. Meu amigo, temos um longo trabalho pela frente!
   - Então o senhor acredita em mim?
   - Claro!

   Após aquele exaustivo dia, João finalmente se deita na aconchegante cama que sua mãe nunca deixara de arrumar sonhando com a sua volta. No meio da noite, já no estado de sono profundo, da testa dele sai um feixe de luz que vara a escuridão das ruas e chega à residência de Afrânio. O cientista, como que laçado pela luz, vai ao encontro de João. E ambos saem para uma longa viagem rumo a outra moradia da humanidade.

                     ISAÍAS GRESMÉS, 16/03/2012

sexta-feira, 9 de março de 2012

A FATIA DE BOLO





  Estava eu passando por aquela viela, como sempre fazia todos os dias, quando avisto, a mais ou menos uns dez metros, aquele meu conhecido, o Leandro. Ainda de longe pude ver que ele trazia nas mãos uma fatia de bolo. Naquele momento tive a nítida sensação de que já havia vivido aquele episódio em algum intervalo de tempo do passado.
Ao se aproximar de mim, Leandro sorrindo, estende as suas mãos e me oferece uma fatia de bolo. Eu, com minha barriga de menino abandonado, agradeci apenas com um olhar assustado e surpreso. Sem titubear devorei-a e nem percebi quando o bondoso amigo se foi.

   O celular me desperta, como eu o havia programado, às 6h. Levantei da cama com aquele sonho impressionante em minha mente. “Mas como podia ser?”, pensei. Se na primeira ocasião em que ocorrera aquele encontro inusitado entre mim e Leandro, naquela viela, ele me havia negado um pedaço do seu bolo?
    Lembro como se fosse hoje: estava andando sem rumo por aquele local, quando vi, ao longe, Leandro vindo em minha direção. À medida que se aproximava de mim, pude ver que ele trazia entre as mãos uma apetitosa fatia de bolo. Não pensei duas vezes e, ao ficar frente a frente com ele, pedi-lhe um pedaço.
   “Sai fora passa fome, não vou dar não!”.
   Meus olhos se encheram d’água, porque, embora fosse verdade o fato de eu ser aquilo que ele me disse, essa expressão me doía na alma. Continuei no meu caminho, agora triste e com a barriga roncando de fome. E por que agora, decorridos mais de vinte anos, sonho com aquele episódio verídico, mas desta vez com final feliz?

   Minhas indagações foram interrompidas pelo som estridente da campainha. Vesti uma bermuda rapidamente e fui abrir a porta. Minha surpresa foi tão grande que não pude me conter e comecei a chorar. Na minha frente estava dona Maria, mãe de Leandro, com uma fatia de bolo, tão suculenta quanto aquela do meu sonho. Ela, muito emocionada, diz-me a que veio.
   - Bom dia João, permita-me entrar? – Estou aqui, respira fundo e continua – em nome do... do meu filho Leandro.
   - Mas como assim dona Maria? – Como isso é possível?
   - Não sei meu filho! – Mas ontem tive um sonho no qual meu inesquecível filho Leandro me aparece e me faz uma solicitação bem clara: “... Mãe, pelo amor de Deus, conserta um grave erro que eu cometi no passado...” - E após longa explicação, pude concluir que tinha mesmo que lhe trazer esta fatia de bolo... Toma querido, aceite, este é um pagamento de uma dívida, paga agora por mim, do meu filho!
Abracei a bondosa senhora. Peguei aquela fatia de bolo e comecei a comê-la. Dona Maria me observava em lágrimas. Mas não eram lágrimas de dor, eram de alegria.
   - É dona Maria – falei dirigindo-me a ela – agora entendo o sonho que tive com o seu filho... Onde quer que ele esteja, sinto que neste momento está bem melhor... E eu também, e eu também...
   - Todos nós, meu filho! Todos nós - repetiu dona Maria.

ISAÍAS GRESMÉS, 4/03/2012

sábado, 25 de fevereiro de 2012

JAPÃO x ITÁLIA - COPA DO MUNDO 2014




Começa a transmissão da final da Copa do mundo do Brasil 2014.
Na rádio Gresmelândia inicia-se a execução do logoton das transmissões futebolísticas.

(Após o logoton, entra o grande, o maioral, o colossal, Zé Cemitério).

“Zé-zé-zé-Zé Cemitério!”

- É isso mesmo! – pode acordar almas penadas do meu Brasil, pois começa mais uma transmissão deste locutor que vos fala! E se o Brasil não chegou à final, não vai ser por isso que deixaremos de levar até vocês todo o nosso entusiasmo nesta tarde. E já estão posicionadas em cada lado do campo as duas seleções finalistas desta copa do mundo: de um lado o selecionado da Itália, e do outro, a surpreendente seleção japonesa.
(Após demorada análise do mala do comentarista, Zé Cemitério chama o repórter de campo.)

- E agora eu chamo o nosso repórter de campo para nos passar a escalação das duas equipes: é com você Trovoada!
- Segura ai Zé: a seleção da Itália começa como 1- Maquecuzone no gol; 2 – Cagone, lateral direito;  6 - Putani, lateral esquerdo; 3 - Pontapezoni, zagueiro pela direita,  4 – Colizione, zagueiro pela esquerda; 5 – Maquetanque, volante; 8 – Pertomeuscunhone, meia direita; 10 – Priquitone, meia esquerda; no ataque: 7 – Chutone; 9 – Caralhone e 11 – Pintone. – Depois eu passo o banco.

- E para segurar a fortíssima seleção da Itália, como vem armado o Japão, Trovoada?
- Anota aí Zé Cemitério: a seleção do Japão começa como 1- Nakata Enunsorta no gol; 2 – Takashute Nakara, lateral direito;  6 – Sometu Upé, lateral esquerdo; 3 – Sotomu Inundô, zagueiro pela direita,  4 – Soquebru Ascoshas, zagueiro pela esquerda; 5 – Tadanu Nafussa, volante; 8 – Tanaka Kitoka, meia direita; 10 – Tanaka Kipassa, meia esquerda; no ataque: 7 – Kishute Dahora; 9 – Sometu Nugoro e 11 – Kimedu DipiKa. – Depois eu passo o banco, pois já vai começar a partida Zé!

(Toca o logoton mais uma vez)

- Começa a partida! – Pertomeuscunhone toca a bola para Pintone, Pintone enfia a bola para priquitone, chega Sotomu Inundô  e toma a bola para o Japão! ...

...- Meu amigo, você já tomou a cerveja Nokumi? – Não? – Então toma! – Você vai beber e dizer feliz: Nokumi é refrescante, Nokumi é da hora! – Então meu amigo, peça Nokumi, eu por exemplo, adoro quando alguém Nokumi dá!...

... - Desce o Japão em contra-ataque com Tanaka Kitoca, que lança na esquerda para Tanaka Kipassa, o japonês liga na ponta para Kimedu Dipika que lança na área para Sometu Nugoro, Sometu chuta a bola, pula Maquecuzone , não pega nada e gol! – e que golaço!
- Gooooooooooooooooooooooooooooool, do Japão!
 – Diz aí Trovoada, o que só você viu?!
- Muito bem Zé Cemitério, num contra-ataque fulminante do selecionado Japonês, após falha individual do meia Priquitone, o zagueiro japonês Sotomu Inundô, tomou a bola e ligou o contra-ataque, que culminou no gol da seleção do Japão.

- E aí meu amigo, você quer que eu confirme o tempo e o placar do jogo? – Na marca dos 44 minutos, primeiro tempo da final da copa do Brasil 2014, temos: Japão, 1; Itália, nada!


- E apita o juiz! – Fim do primeiro tempo! –

(Após os comerciais, entra o comentarista chato, o que foi citado mais acima.)

- Diga aí InseNeto, qual a sua análise sobre este primeiro tempo entre o Japão e a Itália?
O mala começa a falar:
- Ó, pra dizer a verdade, eu acho que a que a Itália ta afinando muito pro Japão viu! Esse Caralhone ta de brincadeira rapaz! – Ta entrando muito mole na jogada! Isso sem contar esse Priquitone, pô, só toma bola nas costas, ta de brincadeira! – Já a seleção do Japão ta jogando uma bola redondinha Zé. Esse menino,o Sometu Nugoro é muito bom atacante, até parece que tem dois pulmões! Esse outro menino... Como que é?... Eu esqueci o nome dele... o meia esquerda...
 – O Tanaka Kipassa, acode o pentelho, Trovoada, o repórter que não dá mancada.
– Grande Trovoada, elogia o comentarista pentelho, - esse pega na bola quase igual como eu pegava, porque para pegar igual a “eu” é difícil... (dois minutos depois de autoelogios, segue a análise) – Bom, eu acho que o técnico italiano tem que tirar o Priquitone e colocar o Bucetone, que é um jogador que gosta de jogar ali na frente do Caralhone, fazendo um, dois. “Quando” ao Japão, eu acho que deveria recuar o Kimedu Dipika e avançar o Tadanu Nafussa para fazer um, dois, com o Sometu Nugoro.

- Apita o juiz!...

 ... Desce o Japão com Kimedu Dipika, que toca para Tadanu Nafussa, Tadanu vira o jogo e toca para Sometu Nugoro que vem no meio para buscar a bola, ele toca para Tanaka Kitoca; chega Maquetanque e toma a bola para Itália; ... e olha para o lado esquerdo e passa a bola para Bucetone, que entrou no lugar de priquitone. Bucetone fica trocando passes curtos com Caralhone, e os dois entram na pequena área envolvendo a defesa japonesa; Bucetone passa por Takashute Nakara, vem Soquebru Ascoshas que leva um chapéu de Bucetone, sem deixar a bola cair lança para Caralhone, que chuta e, gol!  E que golaço!
- Gooooooooooooooooooooooooool!, da Itália!
- E aí Trovoada, qual foi o lance que só você viu?
- Numa jogada construída um pouco depois da linha do meio de campo, entre Bucetone e Caralhone, que ficaram trocando passes ali, num vai-e-vem frenético, terminou com uma pintura de gol de Caralhone que entrou com bola e tudo na meta do Japão, empatando a partida para Itália...

...- E ai meu amigo, já tomou a cerveja...

... - Quando o relógio marca 45 minutos do segundo tempo, será que teremos tempo extra?...
 – De repente não! – Vem o Japão com Tanaka Kitoka, que olha para o lado e enfia a bola para Kishute Dahora, ele olha o goleiro Maquecuzone adiantado, chuta de cobertura e, gol! – Puta que pariu, que golaço!
-Gooooooooooooooooooooooooooooool!, do Japão! – E não há mais tempo pra nada! – O Japão é campeão mundial da copa do Brasil 2014! – Pode comemorar colônia japonesa do Brasil, o Japão é campeão do mundo!



ISAÍAS RODRIGUES DE OLIVEIRA, 25/02/2012














quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

POETAS MORTOS*


POETAS MORTOS*

Certo dia, ao chegar em casa após uma rotina extenuante de trabalho, Dr. João Kukaboa, respeitado psicólogo, pressente algo de errado em sua residência. Notou que o vidro da porta estava quebrado e que a mesma estava entreaberta. Ficou tomado por um calafrio, mas decidiu verificar o que havia acontecido. Ao adentrar a casa, escutou a esposa lá no quarto, o que o deixou aliviado, mas o medo logo tomou conta de si quando viu um vulto no banheiro. Dirigiu-se a passos largos até lá. Foi quando foi surpreendido por um dos seus pacientes.
- O senhor me disse que os meus sonetos eram ótimos!
- Calma Sem-as-mões! Vamos conversar!
- Conversar que nada! – Grita o sonetista infeliz – e saca de uma arma, apontando-a para o corpo do psicólogo.
- Abaixa esta arma, vamos conversar! – Respira fundo, acalme-se!
- Acalmar uma porra! – Você me disse que meus sonetos eram perfeitos, que tinham rimas ricas, métrica, e blá-blá-blá, aí eu acreditei e postei lá no Recanto das Letras e sabe o elogio que eu recebi seu filho da puta?
-Não, qual foi?
- Só do tipo assim: “Adorei o seu soneto. Me visita” – Ou “Seu soneto está legal, mas e a métrica?”
Dr. João estava ciente que a situação fugia cada vez mais do seu controle. Decidiu efetuar uma manobra mais ousada.
- Faz o seguinte, abaixa a arma, e toma esta pílula aqui ó (Dr. João oferece um medicamento ao Sem-as-mões).
O poeta infeliz ficou então mais possesso.
- Enfia este remédio no...
Neste momento ele foi interrompido pelo médico.
- Calma aí rapaz! – Quer saber de uma coisa? – gritou o Dr.
O doido infeliz - pego de surpresa, responde.  – O quê?
- Os seus sonetos são uma porcaria mesmo! – Eu não aguentava mais ouvir você declamando-os para mim, paciência tem limites, faça-me o favor, vai ser chato assim lá nos raios que o parta!
- Ah é, é! – Então toma!
O pseudopoeta efetua um disparo no abdome do médico. Ele cai.
O xerox de poeta, ao ver a besteira que acabara de fazer, dá cabo da própria vida ali mesmo.
- A esposa do médico chega logo em seguida, aos berros, e logo tenta socorrer o esposo.

PARTE II

Dias depois Dr. João estava andando perto de uma biblioteca pública quando, ao olhar para uma das entradas, viu a figura de um menino que lhe chamou a atenção. Decidido, segue em direção dele. O menino, ao perceber que estava sendo seguido por ele, foge. O Dr. Não desiste e chega até o menino.
- Olá, como é o seu nome?
O menino nada diz. Apenas arregala os olhos e foge.

No outro dia, no mesmo horário, o médico se depara com o enigmático menino. Resolveu mais uma vez ir até ao menino, mas desta vez não o deixaria escapar. Foi seguindo ele até uma das prateleiras de livros. Lá iniciou um diálogo.
- Olá, como se chama?
O menino apenas olha para ele e nada diz. – Posso saber o seu nome?  - Por que vem tanto aqui? - E por que você está com esta pilha enorme de livros sobre Física Quântica?
- Meu nome é José, mas me chamam de Zezinho.
- Viva! – Que bom que decidiu falar comigo! – Mas me diga Zezinho, qual o seu interesse em um assunto tão adulto e tão complicado como a Física Quântica?
- Se eu falar o senhor promete que não ri?
- Claro meu querido, pode se abrir comigo!
O menino, ainda meio ressabiado, decide então se abrir com o médico.
- Sabe o que é – fala quase sussurrando – eu escuto POETAS MORTOS!
O médico, surpreso pela revelação, pergunta:
- Como assim?
- Eles estão por toda a parte... Escreveram a vida toda, na esperança de terem o reconhecimento do grande público, mas o que acontece, na maioria das vezes, é que eles morrem sem reconhecimento algum... Eu os vejo por toda parte.
- Você tem certeza que eles, esses poetas os quais você se referiu, estão mortos?
- Tenho! – E presta atenção no que eu vou lhe dizer... – Zezinho faz uma pausa e continua – Eles só veem o que querem ver e só gostam de ouvir elogios sobre as suas obras.
- Tudo bem, responde Dr. João, mas eu fiquei com uma dúvida: - por que você vem aqui nesta biblioteca e retira esta pilha de livros sobre Física Quântica?
- Ora, o senhor não sabe?
- Não.
- Eu descobri que a quase totalidade dos poetas odeiam Física! – Então passei a estudar esta ciência na esperança de me livrar deles e, quem sabe, atrair a atenção de alguém como Einstein, Newton...
- Entendi.
Agora me dá licença, pois preciso ir.


Ao voltar para casa, o médico notou que a sua esposa deixara a porta da casa fechada.


No outro dia, no mesmo local, Dr. João se encontra com o menino. Resolveu se aprofundar no assunto que começara no dia anterior.
- Explica-me tudo o que conversa com os poetas mortos.
O menino fala que os poetas são, na maioria, tristes, sobretudo porque não obtiveram o reconhecimento em vida e, agora, após a morte, foram esquecidos até pelos amigos virtuais. Zezinho disse que eles se queixam pelo fato de não poderem mais deixar suas emoções registradas em forma de versos.
- E o que você faz quando eles ficam insistindo em se comunicar com você?
- Eu pego um livro de Física e começo a explicar a Teoria da Relatividade para eles. Não dá dez minutos e todos somem no além!
- Presta atenção, você não vai mais fazer isso! – De agora em diante, quando eles quiserem se comunicar com você, atenda-os, entendeu?
- Mas eu tenho medo! – E, além disso – odeio poesias! – meu negócio é Física!
- Mas você não quer se livrar deles? – pergunta espertamente o médico.
 - Sim, quero!
- Então faça isso e conseguirá esse intento.


PARTE III

E, daquele dia em diante, a rotina de Zezinho mudou. Passava o dia ouvindo as declamações dos poetas mortos.
Tinha dia que só vinham trovadores. Outros dias, sonetistas. O pior dia para o menino era quando apareciam os cordelistas, os contistas e os cronistas; ele ficava até com dor de cabeça. Mas seguiu firme.
Depois de ouvi-los, passava um relatório minucioso ao médico. Ele, por sua vez indicava qual tipo de abordagem o menino deveria utilizar, de acordo com a gravidade do caso.
E assim Zezinho foi se acostumando cada vez mais com aquela sua estranha habilidade. O médico notou que, a cada dia que passava, ele ficava mais calmo, mais sereno.
O menino relatava os progressos obtidos com os poetas mortos. Dizia que muitos deles não mais apareciam para ele, e se dizia estar feliz por isso.


PARTE IV

Ao chegar novamente em sua residência o médico notou que a porta estava fechada. Deu então uma volta por trás dela e de lá viu uma cena que não gostou. A sua esposa estava nos braços de um amigo. Notou que ela chorava. Nada entendeu. Completamente decepcionado, saiu zanzando pelas ruas sem rumo definido.

Passaram-se vários meses. Sempre quando ele voltava para casa encontrava a porta fechada.
Certo dia, chegou no exato momento em que a sua esposa saía com o seu amigo. Quis correr até aos dois, mas conteve-se.


Em mais um dia de encontro com o menino, o médico decide fazer uma pergunta que queria fazer a muito tempo.
- Zezinho, no primeiro dia em que nos encontramos você me disse que eles, os poetas mortos, só veem o querem ver e só ouvem o que querem ouvir.
- É isso mesmo!  - Alguns pensam que ainda estão vivos!

Dr. João ficou mais confuso ainda depois da explicação do menino.

Ao voltar para a sua casa, desta vez encontrou a porta aberta.
Entrou e, só ai, lhe veio à memória todo o ocorrido. Lembrou do paciente doido que lhe aparecera de súbito, do tiro que levara e da sua esposa aos prantos. Concluiu, sem que lhe restasse nenhuma dúvida, que estava morto.
Foi até o quarto. Lá encontrou a esposa dormindo. Percebeu que ela estava em estado de sonambulismo, pois falava alguma coisa. Conversou com ela. Disse que a amava, mas que ela deveria seguir com a sua vida e esquecê-lo. Que estava bem e jamais a esqueceria.
Ela, no seu estado de sonolência, também lhe disse que o amava e que jamais o esqueceria.

No outro dia, ao encontrar-se com o garoto, o médico, em lágrimas, apenas disse:
 - Adeus!

Texto inspirado no filme “O SEXTO SENTIDO” de  M. Night Shyamalan.*

ISAÍAS GRESMÉS, 22/02/2012