sexta-feira, 9 de março de 2012

A FATIA DE BOLO





  Estava eu passando por aquela viela, como sempre fazia todos os dias, quando avisto, a mais ou menos uns dez metros, aquele meu conhecido, o Leandro. Ainda de longe pude ver que ele trazia nas mãos uma fatia de bolo. Naquele momento tive a nítida sensação de que já havia vivido aquele episódio em algum intervalo de tempo do passado.
Ao se aproximar de mim, Leandro sorrindo, estende as suas mãos e me oferece uma fatia de bolo. Eu, com minha barriga de menino abandonado, agradeci apenas com um olhar assustado e surpreso. Sem titubear devorei-a e nem percebi quando o bondoso amigo se foi.

   O celular me desperta, como eu o havia programado, às 6h. Levantei da cama com aquele sonho impressionante em minha mente. “Mas como podia ser?”, pensei. Se na primeira ocasião em que ocorrera aquele encontro inusitado entre mim e Leandro, naquela viela, ele me havia negado um pedaço do seu bolo?
    Lembro como se fosse hoje: estava andando sem rumo por aquele local, quando vi, ao longe, Leandro vindo em minha direção. À medida que se aproximava de mim, pude ver que ele trazia entre as mãos uma apetitosa fatia de bolo. Não pensei duas vezes e, ao ficar frente a frente com ele, pedi-lhe um pedaço.
   “Sai fora passa fome, não vou dar não!”.
   Meus olhos se encheram d’água, porque, embora fosse verdade o fato de eu ser aquilo que ele me disse, essa expressão me doía na alma. Continuei no meu caminho, agora triste e com a barriga roncando de fome. E por que agora, decorridos mais de vinte anos, sonho com aquele episódio verídico, mas desta vez com final feliz?

   Minhas indagações foram interrompidas pelo som estridente da campainha. Vesti uma bermuda rapidamente e fui abrir a porta. Minha surpresa foi tão grande que não pude me conter e comecei a chorar. Na minha frente estava dona Maria, mãe de Leandro, com uma fatia de bolo, tão suculenta quanto aquela do meu sonho. Ela, muito emocionada, diz-me a que veio.
   - Bom dia João, permita-me entrar? – Estou aqui, respira fundo e continua – em nome do... do meu filho Leandro.
   - Mas como assim dona Maria? – Como isso é possível?
   - Não sei meu filho! – Mas ontem tive um sonho no qual meu inesquecível filho Leandro me aparece e me faz uma solicitação bem clara: “... Mãe, pelo amor de Deus, conserta um grave erro que eu cometi no passado...” - E após longa explicação, pude concluir que tinha mesmo que lhe trazer esta fatia de bolo... Toma querido, aceite, este é um pagamento de uma dívida, paga agora por mim, do meu filho!
Abracei a bondosa senhora. Peguei aquela fatia de bolo e comecei a comê-la. Dona Maria me observava em lágrimas. Mas não eram lágrimas de dor, eram de alegria.
   - É dona Maria – falei dirigindo-me a ela – agora entendo o sonho que tive com o seu filho... Onde quer que ele esteja, sinto que neste momento está bem melhor... E eu também, e eu também...
   - Todos nós, meu filho! Todos nós - repetiu dona Maria.

ISAÍAS GRESMÉS, 4/03/2012

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