MINHA
HISTÓRIA*
Minha mãe
antes de me deixar, ensinou-me muitas coisas. Ainda sinto a presença dela e sei
que ela nunca me deixará sozinho.
Certo dia
perguntei à minha mãe como foi que eu cheguei a este mundo. Foi assim que ela
me narrou o ocorrido:
- Meu filho
era já tarde da noite, seu pai dormia ao lado da sua inseparável carroça,
quando os doloridos sinais da natureza, avisaram-me que era chegada a hora de
eu ser mãe. Aninhei-me ali perto do seu pai e confiei a minha sorte à suprema
força que tudo rege, seja ela quem for.
- E meu pai
mãe? Ele não te ajudou? – a interrompi, ansioso por saber da atitude que ele
tomara na ocasião.
- Ele roncava
meu filho... Por certo estava sob o efeito daquela coisa que o transformava
quando ele a consumia...
- Entendo.
Mas, continua!
- Você não
veio sozinho não! Antes de você nasceu seu irmão, mas infelizmente a vida não
quis nele aflorar, pois ele veio a este mundo apenas para cumprir aquela que
para a maioria é a última etapa...
Minha mãe
neste momento olhava para o horizonte como a refletir e continuou na narrativa.
- Logo em
seguida veio você que, ao contrário do seu irmão, gozava de saúde!
- Que legal
mãe!
Foi assim que
eu fiquei sabendo da minha origem.
Minha mãe, a
cada dia que se passava, eu sentia que ela já não trazia em seus olhos, o vigor
de antigamente... Meu pai também se deteriora muito nos últimos tempos. E a
causa era aquela água estranha que ele bebia.
Eu ficava
muito triste com ele, mas o amava tanto quanto amava a minha velha mãe.
Ela sempre me dizia:
- Meu filho,
nunca abandone seu pai! Lembre-se, ele nunca deixou faltar nada para a gente...
É certo que ele anda adoentado devido àquela coisa que ele toma a toda hora,
mas é um homem bom e também nos ama. Esteja com ele mesmo depois que eu partir.
- Para onde a
senhora vai partir mãe?
- Não sei meu
filho, mas sinto que a minha hora está chegando! Mas não tenho medo não!
Neste momento
minha mãe me ensinou uma lição que segue gravada em meu ser até hoje. Foi assim
que ela iniciou a tal lição:
“ Eu sinto que
já cumpri com a minha missão neste mundo... Nasci, cresci, tive a felicidade de
arrumar um pai para você e agora me sinto pronta para seguir adiante... Já vi
muitos dos meus semelhantes abandonados, surrados, mortos nas esquinas e até
jogados em qualquer lugar, mas nada disso me assusta, pois sei que o que estava
lá abandonado, surrado ou até morto em qualquer lugar, era apenas a parte que
vira pó; algo parecido com os alimentos que comemos: parte alimenta nossos
corpos; outra parte é descartada por nossos
organismos e virará pó novamente. Meu corpo virará pó, mas alguma coisa que
vive dentro de mim não! Essa coisa que eu não sei nomear, permanecerá te
vigiando para todo o sempre meu filho”.
Após algum
tempo minha mãe se foi.
Meu pai ficou
muito triste, mas dentro das suas possibilidades, concedeu a ela todas as
honrarias fúnebres que certamente minha velha merecia.
Naquela noite
meu pai, penso eu, exagerou no consumo daquela água fedida. De madrugada,
também seu coração parou de bater. Cheguei bem perto dele e lambi-lhe a face já
sem vida.
Agora eu
estava sozinho no mundo, mas não sentia medo, pois sabia que minha mãe me vigiava
e, talvez, meu pai também.
De repente
senti alguns ruídos perto dali. Eram ruídos de rivais. Também senti um cheiro
que me deixou alucinado. Aquele era um chamado do qual eu não pude resistir:
era um cheiro de fêmea!
Sim, eu
estava pronto para o combate com meus rivais! Era chegada a hora de perpetuar a
minha espécie! Lambi a face novamente do meu velho e parti para cumprir mais
uma etapa do meu destino, agora confiando apenas no meu instinto.
* Cachorro, às vezes, parece gente; e gente, às vezes, parece cachorro...
ISAÍAS
GRESMÉS, 15/09/2012
Amigo Isaias, que beleza sua narrativa, se real ou fantasia, achei sensacional, tocante e envolvente até o fim, e o fim , fechaste com chave de ouro! Gostei ler esta pérola!
ResponderExcluirAbração!