sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O CALDINHO E A GEMADA COM AMENDOIM




O CALDINHO E A GEMADA COM AMENDOIM

   Já faz algum tempo que alguém me contou esta história, e agora vou relatá-la aqui.
   Havia um casal de velhinhos que vivia em uma casa enorme numa cidadezinha do interior de São Paulo. João era o nome do velho e Emengarda o da simpática senhora. Já beiravam os 80 anos e nunca tiveram filhos. Passaram boa parte da vida naquele casarão estilo colonial, na companhia dos animais domésticos.
    Foi durante um café da manhã que o velhinho João revelou uma ideia sua à esposa:
   - Gardinha, estou pensando em pedir para o Menelau que me mande uma menina lá da cidade dele para vir trabalhar aqui, o que acha minha velha?
    - Sei não fio, gente nova não gosta de lidar com velhos...  – mas você que sabe... O que você decidir ta bom!
    - Então está decidido! Amanhã eu ligo pra ele.
    No outro dia João ligou para Menelau e  acertou tudo.

    Menelau sempre foi um homem muito bem relacionado lá na cidadezinha ande morava, Sátiro Dias, na Bahia. Conhecia todo mundo. Ele era muito respeitado por todos e o povo sempre o consultava para resolver os mais variados problemas. Se alguém estava doente, era ele quem indicava o doutor; se havia uma mulher para dar a luz, corriam atrás dele e Menelau já mandava buscar a parteira. E assim o bondoso homem foi ganhando fama naquele lugarejo e conseguiu se eleger vereador por dois mandatos consecutivos. Depois resolveu deixar a política porque não concordava com os poderosos do local. “São todos uns filhotes de ronquifuças”, saía vociferando, quando indagado sobre o porquê de ter abandonado a política.

    João ligou para o irmão e Menelau logo se prontificou a ajudá-lo.
    - Pode ficar tranqüilo meu irmão, vou mandar uma menina que trabalha aqui para mim e ela vai cuidar muito bem de vocês. O nome dela é Carminha.
     João fez menção em recusar, pelo fato da moça trabalhar para o irmão, sob o argumento de que assim estaria prejudicando ele. Mas Menelau o convenceu do contrário e, dias depois chegou Carminha.

    Carminha  foi recebida pelo casal na porta.
João, ao vê-la de frente, não pôde deixar de admirar a beleza jovial da moça. “Meu Deus, que criatura linda!”
    - Entra minha querida, adianta Emengarda, pegando na mão da mocinha, levando-a para o interior da residência. João ficou ali estático, mergulhado em pensamentos.

     O tempo foi passando e, a cada dia, Carminha se entrosava mais e mais com o casal de velhinhos. Ela descobriu que a velhinha não podia consumir muito sal porque era hipertensa, mas uma vez por semana, preparava para Emengarda, um caldinho de mocotó com lascas de gerimum e ainda acrescentava uma pitada de pimenta do reino e cheiro verde. A velha adorava, embora no início tivesse recusado. Mas depois que experimentou, passou a exigir o caldinho milagroso todos os dias.
     - Mas, e o coração dona Gardinha! – ponderava Carminha.
     -Esquenta não, fia, se eu morrer depois de tomar o seu caldinho, morro feliz!
     - Fale isso não mulher!

      Carminha também passou a preparar uma iguaria para João, que deixava o velho subindo pelas paredes. Era uma gemada com amendoim e leite de cabra.
      João também era hipertenso, mas não conseguiu se render aos encantos culinários da linda Carminha. Sem contar que depois da gemada turbinada ela fazia uma massagem nele por mais de uma hora.
     - Ai Carminha, assim você me mata!
     - Num fala isso não, seu João, que eu fico sem graça.

     Foi numa tarde de verão, fazia uns 32 graus e a Emengarda pediu o seu caldinho. Carminha foi à cozinha, preparou o prato e logo voltou. A velha senhora tomou o caldinho e foi se deitar em seguida. Não mais se levantou.
    Durante o seu velório todo mundo comentava que ela estava com semblante de feliz, e, embora estivesse morta, parecia estar sorrindo.

     João ficou muito triste, mas foi muito bem amparado pela Carminha.              Ela passou a fazer, não uma, mas três massagens no velho.

    -Sabe Carminha, não sei o que seria da minha vida sem você. Minha vida melhorou muito desde a sua chegada aqui.
    -Bondade da sua parte seu João!
    -Não querida, eu não sei se conseguiria continuar vivendo sem você por perto. E num esforço hercúleo o velho agarrou forte o braço da moça e a puxou em sua direção. Decidido, o velho lascou um beijo nos belos lábios de Carminha. Ela correspondeu e agarrou o morto ressuscitado do velho. Sim, ressuscitado, porque a parte viril do velhinho só voltou à vida depois da gemada dela.
     E foi uma noite daquelas.
     - Ai Carminha, eu te amo minha querida! Quero me casar com você amanhã!
     Carminha nada dizia, apenas mordia as orelhas cabeludas do velho ancião.

      No outro dia João chamou o advogado e solicitou a ele que providenciasse as papeladas referentes ao casamento.
Foi uma cerimônia rápida. Menelau veio abençoar a união.
     -Parabéns meu velho! Carminha é uma bela mulher.

     E a vida seguiu agitada para o recém casal. João todo santo dia consumia a gemada da Carminha, mas não sem antes agradecer com beijos a adorável esposa.
    - Eu te amo Carminha! Você é uma deusa, minha querida!
    - Ai meu velho, venha cá, venha!
     E beijo vai, beijo vem. Afagos vão, afagos vêm. Foi num dia desses que o velho João não resistiu e virou os olhos e, desta vez, não foi de prazer: teve um ataque fulminante durante uma bela tarde de amor com Carminha. Morreu com um lindo sorriso nos lábios. Carminha ficou aos prantos.
     Foi seu Menelau quem veio acudi-la.
     -E agora Menê, o que faço?
    -Chore não minha nega, você vem comigo e tudo voltará a ser como antes...

     Um mês depois Carminha voltava para a casa do Menelau, agora rica, pois herdara tudo o que João e Emengarda haviam juntado durante a vida toda.
     Menelau não cansava de elogiar a bondosa cunhada. “Essa mulher é boa demais!”

ISAÍAS RODRIGUES DE OLIVEIRA, 17/02/2012

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