quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

AMOR ORIENTAL


AMOR ORIENTAL*

   Foi numa manhã ensolarada de primavera que vi Mishiko pela primeira e única vez. Naquele dia eu resolvi passear bem cedo na cidade de Embu das Artes para, finalmente conhecer todos os seus encantos. Fui motivado pela recomendação de um amigo.
   O dia estava lindo. Era primavera, as calçadas estavam lindamente cobertas pelas flores de Ipê Amarelo e foi justamente ao pé de uma dessas árvores, que eu me vi frente a frente com a criatura mais linda do universo!  Aproximei-me para iniciar um contato com ela, mas parei em seguida.
   Não sei direito quanto tempo fiquei ali apreciando a cena, mas verdade é que eu não senti o tempo passar. Ela era escultora e esculpia na ocasião um bebê que segurava uma mamadeira. Estava tão envolvida no seu trabalho que nem notou a minha presença.
   Não sei como, de repente me vi andando de mãos dadas à japonesa, numa alameda arborizada com imensos ipês. Paramos bem no meio daquela rua perfumada e sob uma orquestra de pardais e bem-te-vis nos beijamos magicamente. Um leve toque no meu ombro me fez voltar à realidade: era Mishiko se apresentando a mim. Só então pude perceber que aquela deusa de olhos puxados era muda e só se comunicava com mímicas. Pude ler o seu nome no lado esquerdo do seu avental de artista. O momento foi mágico, pois a sua deficiência na fala, não se fez empecilho para que iniciássemos ali uma conversa que varou o dia...
Nossa comunicação se desenvolveu fluidamente e, à medida que o tempo passava, ficávamos mais envolvidos...


   Um fortíssimo trovão arranca-nos dos nossos sonhos, ou melhor, de um sonho do qual nós dois já fazíamos parte... Olhei para o relógio... “Meio dia!”
   Outro trovão... Pingos... Chuva torrencial.
   Despedi-me da minha flor oriental prometendo voltar outro dia. Ela sorriu. Eu me virei em direção ao meu carro e com o coração já encharcado de saudades, parti.

   Dois dias depois, cantarolando, saí logo cedo para Embu das artes. Ao chegar estacionei o carro e corri em disparada para o encontro do meu amor. Faltando alguns metros notei um movimento estranho no lugar onde ela trabalhava: o imenso ipê amarelo estava ao chão e havia um grupo de trabalhadores recortando seus galhos imensos. Fui chegando e notei que o tronco da árvore fora partido ao meio como de fosse um graveto.
   “O que aconteceu com esta árvore?” – perguntei a um deles, não tendo coragem de perguntar primeiro sobre o paradeiro da minha deusa de olhos puxados.
   “Então você não sabe?”
   “Não”, respondi.
   “Dois dias atrás, mais ou menos na hora do almoço, a ‘Japa’ estava recolhendo o seu material de serviço, quando começou a chover. E foi ai que caiu um raio nesta árvore... ela morreu fulminada na hora!” 

   Hoje, passados vários anos do triste episódio, ainda lamento pelo ocorrido, pois se em um dia eu conheci meu verdadeiro amor, no mesmo dia o perdi. Sim, perdi! Perdi sem tê-lo concretizado, sem ao menos ter sentido o gosto dos seus lábios! Ah, como eu queria ter um filho com ela! Como seria lindo ver nossa família eternizada em uma de suas esculturas! Agora o que tenho é só a sua imagem que ficou para sempre esculpida na minha alma.

   ISAÍAS GRESMÉS 12/01/2012
  * Conto baseado na poesia “paixão oriental”, de minha autoria.

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