segunda-feira, 11 de agosto de 2008

AMOR PATERNAL

O AMOR PATERNAL

Seu José:

-Acorda filho! Já passa das 7h00 da manhã! Vamos, senão não encontraremos mais nada. Seu José desperta o filho João para mais um dia de trabalho duro. Sabe que aquela rotina é pesada para ele, mas não há outra forma de sustentar a família, composta por mais três filhos menores: Camila, um bebê de um ano, Danilo, de 6 e Regina, de oito anos.

S. José
Acorda filho meu
Vamos para o batente
Antes que o sol esquente
Pois o dia amanheceu

João:
Meu pai, deixa eu dormir
Somente mais um pouquinho
Aqui está tão quentinho
Hoje eu não quero ir


Seu José se sentia culpado por não poder proporcionar ao filho uma infância normal, como de quase todas as crianças da sua idade. João ajudava o pai das 8h00 às 14h00, de segunda a sábado; depois freqüentava a escola, onde cursava o ensino fundamental. Seu José sempre se lamentava em pensamento “... até quando meu Deus, vamos levar essa vida?! Ele só tem 11 anos!”

O trabalho é iniciado
Pela dupla de valentes
Retrato da nossa gente
Em troca de alguns trocados

A carroça, o pai puxando
E o filho indo atrás
Catando materiais
Pelas ruas vão andando

Parando aqui e ali
Pegando toda tranqueira
No plano e na ladeira
Amarando pra não cair

João:
Meu pai, veja o que eu achei
É um livro de poesias
De um tal de Jeremias
Por ele me encantei

S. José:
Meu filho, larga mão disso
Que isso não vale nada
Atenha-se à catar latas
Estamos aqui pra isso

Poesia é ilusão
Não enche a barriga não
Então vê se me ajuda
Largue disso e não se iluda

João, obediente, acatou o conselho do pai e prosseguiu na busca pelos materiais recicláveis, mas no seu coração, aquelas poucas palavras que tinha lido naquele livro velho e sujo do tal Jeremias, já tinham sido gravadas. “Quando eu chegar em casa, vou ler todo o livro”, pensou João.

Com a carroça entulhada
Deu-se fim à empreitada
E os dois seguem para a missão
De vender a produção

E o que der de dinheiro
Será gasto por inteiro
No mercadinho Comprebem
Onde o preço não convém...

Com dois quilos de arroz, um quilo de feijão, dois quilos de batata, três quilos de farinha, um quilo e meio de “retalhindo” e um litro de leite, seguem pai e filho para casa, após cumprir mais uma jornada.

S. José:

Só falta a lenha meu filho
Encheremos a carroça
Com algumas madeiras grossas
Seguras com amarrilho

Depois disso vamos embora
Pois está quase na hora
De você ir estudar
Então vamos nos apressar


Com a compra e a madeira, seguem finalmente os dois para casa, onde esperam por eles D. Conceição e as demais crianças.
Após tomar um banho rápido, João vai para a escola – sem comer – pois sua mãe estava esperando que o marido e o ele próprio, trouxessem alguma coisa para fazer. “Eu como o lanche lá da escola”, conformou-se.
No caminho João foi folheando aquele livro que achara no lixo e ficou encantado com a beleza dos versos. Leu um poema que falava dos pais e lembrou-se do seu velho. Uma lágrima rolou na sua face:

“O pai é o porto onde ancoramos nosso barco.
Da nossa vida, é a estrutura;
Da nossa ponte é o arco;
É o bronze da escultura
Da nossa vida futura -
Em nossa lembrança será um marco.”

Na hora do lanche João devorou a refeição rapidamente e procurou um cantinho mais sossegado para continuar a ler o surrado livro. Enquanto isso, seu José iniciava mais uma rotina... triste rotina. Dirigiu-se para o boteco da esquina para iludir sua mente com cachaça.

S. José
Vou beber no bar da esquina
Porque ando descontente
Dessa vida inclemente
E da loucura da minha sina

Eu não agüento mais ver
Minha família sofrendo
O meu peito está doendo
Acho que quero morrer...

E essa rotina prosseguiu. Seu José chegava em casa cada vez mais embriagado e D. Conceição discutia com ele. As crianças ficavam chorando. João entristecia com a situação do seu querido velho.
Certo dia, voltando da escola, encontrou seu velho caído no campinho de terra perto da casa.

João
Acorda pai! Levanta!
Aqui não é lugar de ficar
Anda!

Meu pai, mas que pele fria
Mas está tão quente o dia
Levanta!

Meu pai, num durma aqui não...

Seu José não mais acordou. João seguiu na luta sozinho, ou melhor, na verdade agora acompanhado dos dois irmãos: Danilo e Regina. Era ele o comandante agora. Era ele que ensinava aos irmãos mais novos a dura batalha da busca pelo sustento diário. Mas no seu coração ficara gravado as lições que aprendera com o pai: “trabalha meu filho, que Deus há de olhar por você”.
Hoje João é pai. Possui uma vida confortável que foi construída à custa de muito trabalho. Sua estante é repleta de livros. E há um lugar especial dedicado à foto de seu querido pai e àquele livro surrado, do tal poeta Jeremias, que serviu também como base em sua formação.

FIM

Isaías Gresmés 11/08/2008

4 comentários:

  1. Querido Amigo Isaías, muito bom aliás ótimo!!

    Uma Vida sofrida com muita dificuldade, mas João
    poderia sem o pai ter ido para caminhos errados,
    mas seu Pai te deixou de herança o caratér e a garra
    para continuar aquela luta e ajudar a familia e
    soube muito bem conduzir seus caminhos e buscou na
    poesia as palavras certas, que o fizeram refletir para
    lutar e vencer na vida.

    Parabéns amigo, eu amei seu conto!

    Cláudinha
    BH 11/08/08

    ResponderExcluir
  2. Amigo Isaías,

    Achei o conto comovente e fantástico. As rimas bem colocadas misturadas à prosa tornaram a leitura mais agradável. Isso sem mencionar que é uma bela história e muito bem escrita. Você está no caminho certo. Parabéns!

    ResponderExcluir
  3. QUERIDO, COMO JA LHE DISSE, SEU TEXTO LEVOU-ME ÀS LÁGRIMAS, LINDO, LINDO...ADORO LER TUDO O QUE ESCREVES

    ResponderExcluir
  4. Maravilhoso!
    Passou um filme em minha cabeça que me levou as lagrimas.Eu me orgulho de tê-lo como irmão.

    ResponderExcluir

Eu, desde já agradeço a você, nobre amigo(a), pela presença aqui. Fique à vontade quanto ao seu comentário.