AMOR ORIENTAL*
Foi numa manhã ensolarada de primavera que
vi Mishiko pela primeira e única vez. Naquele dia eu resolvi passear bem cedo
na cidade de Embu das Artes para, finalmente conhecer todos os seus encantos.
Fui motivado pela recomendação de um amigo.
O dia estava lindo. Era primavera, as
calçadas estavam lindamente cobertas pelas flores de Ipê Amarelo e foi
justamente ao pé de uma dessas árvores, que eu me vi frente a frente com a
criatura mais linda do universo!
Aproximei-me para iniciar um contato com ela, mas parei em seguida.
Não sei direito quanto tempo fiquei ali
apreciando a cena, mas verdade é que eu não senti o tempo passar. Ela era
escultora e esculpia na ocasião um bebê que segurava uma mamadeira. Estava tão
envolvida no seu trabalho que nem notou a minha presença.
Não sei como, de repente me vi andando de
mãos dadas à japonesa, numa alameda arborizada com imensos ipês. Paramos bem no
meio daquela rua perfumada e sob uma orquestra de pardais e bem-te-vis nos
beijamos magicamente. Um leve toque no meu ombro me fez voltar à realidade: era
Mishiko se apresentando a mim. Só então pude perceber que aquela deusa de olhos
puxados era muda e só se comunicava com mímicas. Pude ler o seu nome no lado
esquerdo do seu avental de artista. O momento foi mágico, pois a sua
deficiência na fala, não se fez empecilho para que iniciássemos ali uma
conversa que varou o dia...
Nossa
comunicação se desenvolveu fluidamente e, à medida que o tempo passava,
ficávamos mais envolvidos...
Um fortíssimo trovão arranca-nos dos nossos
sonhos, ou melhor, de um sonho do qual nós dois já fazíamos parte... Olhei para
o relógio... “Meio dia!”
Outro trovão... Pingos... Chuva torrencial.
Despedi-me da minha flor oriental prometendo
voltar outro dia. Ela sorriu. Eu me virei em direção ao meu carro e com o
coração já encharcado de saudades, parti.
Dois dias depois, cantarolando, saí logo
cedo para Embu das artes. Ao chegar estacionei o carro e corri em disparada
para o encontro do meu amor. Faltando alguns metros notei um movimento estranho
no lugar onde ela trabalhava: o imenso ipê amarelo estava ao chão e havia um
grupo de trabalhadores recortando seus galhos imensos. Fui chegando e notei que
o tronco da árvore fora partido ao meio como de fosse um graveto.
“O que aconteceu com esta árvore?” –
perguntei a um deles, não tendo coragem de perguntar primeiro sobre o paradeiro
da minha deusa de olhos puxados.
“Então você não sabe?”
“Não”, respondi.
“Dois dias atrás, mais ou menos na hora do almoço,
a ‘Japa’ estava recolhendo o seu material de serviço, quando começou a chover.
E foi ai que caiu um raio nesta árvore... ela morreu fulminada na hora!”
Hoje, passados vários anos do triste
episódio, ainda lamento pelo ocorrido, pois se em um dia eu conheci meu
verdadeiro amor, no mesmo dia o perdi. Sim, perdi! Perdi sem tê-lo
concretizado, sem ao menos ter sentido o gosto dos seus lábios! Ah, como eu
queria ter um filho com ela! Como seria lindo ver nossa família eternizada em
uma de suas esculturas! Agora o que tenho é só a sua imagem que ficou para
sempre esculpida na minha alma.
ISAÍAS GRESMÉS 12/01/2012
* Conto baseado na poesia “paixão oriental”,
de minha autoria.
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