Todo mundo
conhecia o José Carlos Almeida, popularmente chamado de Zequinha. Ele era
figura mais que presente no bairro. No seu rosto o sorriso estava sempre
presente e suas mãos quase sempre estavam ocupadas com componentes eletrônicos
velhos que ele achava nos terrenos baldios da vizinhança. “Se a gente não
reparar nem dá para perceber que o Zequinha tem algum problema”, era o que
todos falavam.
Zequinha
nasceu com retardo mental. E mesmo com vinte e cinco anos, comportava-se como
se tivesse uns sete. Seu passatempo preferido era juntar restos de eletrônicos
velhos. Dizia que iria construir uma nave para viajar até o céu. “Eu quero
conhecer o papai do céu”, costuma explicar bem sério a quem o perguntasse sobre
o que estava fazendo com tudo aquilo.
A mãe de
Zequinha, dona Maria, era uma batalhadora. Casou-se cedo com aquele que foi o
seu único homem. “Foi amor à primeira vista, coisa de contos de fadas, mas eu
não podia esperar que o meu príncipe se transformasse na bruxa do meu conto de
fadas particular”, lamentava-se tristemente quando perguntada sobre seu
companheiro.
Seu casamento ruiu logo no começo, depois que
seu marido caiu na desgraça de usar o crack. A pobre mulher, mesmo grávida de
alguns meses, era espancada pelo infeliz companheiro todos os dias. O amor que
sentia por ele foi se transformando em ódio. Mas não era por ele que ela sentia
repulsa, era por aquela droga maldita.
Um dia o
homem chegou completamente louco, gritando que queria dinheiro. Ela disse a ele
que não havia mais nada na casa, pois ele mesmo havia vendido tudo. O pobre
infeliz, na agonia da falta da droga, correu na direção da janela e voou para a
morte.
Alguns meses
depois veio ao mundo aquele que ficou conhecido mais tarde como Zequinha. Dona
Maria enfrentou muitas dificuldades para criá-lo, pois seu filho nascera com
sérias limitações intelectuais, mas nunca mais se envolveu com nenhum homem.
“Minha vida agora é para criar o meu filho, pois ele é a razão do meu viver”,
emocionava-se sempre quando indagada sobre o porquê de não ter se casado
novamente.
Zequinha
realmente era uma criatura amável, apesar das suas limitações, ajudava a mãe
nos afazeres domésticos, frequentava a escola especial que a mãe tanto se
esforçara para conseguir uma vaga e adorava ir às missas dominicais para cantar
os louvores. Mas sua paixão era o seu “projeto”: passava o tempo todo revirando
os lixos à procura de componentes eletrônicos para “construir” sua “nave
espacial”. No começo dona Maria ralhou com ele, mas depois parou, pois entendeu
que aquilo era um passatempo dele e era uma atividade que o fazia muito feliz.
Certo dia
dona Maria foi até o fundo do quintal onde brincava Zequinha. Ela logo o
avistou. “Obrigado meu Deus, por ter me enviado um anjo... Não sei o que seria
de mim sem ele... Obrigado pai amado!”, agradeceu em pensamento a religiosa
senhora. Em seguida, sem que ele notasse, voltou à sala da casa, pegou a sacola
cheia com roupas que havia consertado e foi entregá-las às clientes ali perto.
Zequinha,
completamente envolvido com a sua atividade, não percebeu nem a mãe, tampouco
aquelas criaturas que apareceram do nada e o cercou. Eram três. Nenhum ruído,
nenhuma marca. Zequinha se foi com eles. Dona Maria, no exato momento do
acorrido com Zequinha, desmaiou por alguns segundos. Tempo suficiente para
sonhar com um futuro melhor para o seu filho.
PARTE II
“O que
aconteceu dona Maria! – a senhora está bem”. “Sim, estou, não foi nada. Agora
preciso ir”.
Os vizinhos
se mobilizaram, produziram cartazes que informavam sobre o desaparecimento do
Zequinha. O líder comunitário levou dona Maria até o Distrito Policial da
região. Mas dona Maria estava tranquila, e sempre afirmava que seu filho fora
levado por anjos de Deus e que Zequinha iria voltar completamente curado da sua
enfermidade de nascença. Quando falava, exibia um semblante de fé e alegria.
Todos concluíram que Dona Maria estava enlouquecendo.
Cinco anos se
passaram. Dona Maria continuou levando a vida como se nada estivesse
acontecido. Quando lhe perguntavam sobre Zequinha, ela apenas dizia: “Deus vai
me mandar ele de volta e curado do seu problema mental”. “Pobre criatura! Está
louca!”, concluíam todos.
Certa tarde,
como sempre fazia antes de sair para entregar as encomendas de roupas, dona
Maria foi até o fundo da casa. Foi quando do nada aparece Zequinha. Ele estava
mudado. Seu rosto estava com a barba feita, seu cabelo impecavelmente penteado
e o corpo bem vestido com belo traje. Ele abriu os braços e sorriu. “Vem cá
mãe, obrigado por ter me esperado”. “Oh Zequinha, você nem imagina como eu
estou feliz”. “Minha mãe, o Zequinha foi aquele que foi curado por Deus, de
agora em diante a senhora e todos me chamarão pelo meu nome de registro, ou
seja, José Carlos”. “Que assim seja meu filho.”
Todos os dias
pessoas com problemas mentais desaparecem do nada e nunca mais voltam. Mas elas
nunca desaparecerão dos corações daqueles que as amam.
ISAÍAS
GRESMÉS, 31/03/2012
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